28 maio 2007



Hoje seria apenas um daqueles dias, daquelas horas em que me gostaria de transformar num ser pequenino e invisível, para recomeçar uma caminhada interrompida. Encontrar uma praia, uma que não fosse a nossa, e divagar, deambular, pondo o pensamento no sítio certo e o coração do lado correcto. Enrijecer a musculatura de todo o meu corpo, pondo-a nos sítios apropriados e fazendo os desvios necessários para que o sangue me fizesse viver, mas não reviver em ti. E depois, quando estivesse nada mais que exausta, tão exausta que me seria impossível sequer pedir à minha mais santa de devoção, ajuda para não me perder de mim própria outra vez, e cansada o suficiente para que apenas o repouso simples e imediato, o esvaziar até do silêncio na minha mente, demasiado nebulosa por estes dias, nada mais que isso, e, que me fosses imprescindível, e aí, nesse segundo, sem pensar duas vezes e sem olhar para trás, descobriria um buraco demasiado profundo e demasiado longe de tudo e de todos, numa noite demasiado profunda e escura para te enterrar bem fundo, fundo o suficiente para não te voltar a encontrar nem tão pouco te seguir os sinais para o tentar fazer. E aí enterraria, juntamente contigo, todos os sabores dos teus lábios e dos teus beijos, todos os odores do teu corpo, o da manhã, o da noite, o de quando bebes, o de quando não bebes, o de quando fumas o cigarro fresco, o da pasta de dentes, o do sabonete de mel, o do perfume e até o do simples odor simples da tua pele. Enterraria também o teu mar azul com que me olhas cada vez mais friamente, e acima de tudo era lá que ficaria a distancia que existe, cada vez maior, entre nós, na cama, entre os nossos corpos, quase adormecidos, mas suficientemente alertas para evitar qualquer contacto, desejosos e desesperantes pelo desaparecimento do outro, do espaço livre e visível à sua volta, na mesa, em que não cruzamos um único olhar, nem sequer de desprezo, e, até no carro, que qualquer roçar de mãos é abrasador, cheio de raiva e diria até de repulsa.

Se andar o suficiente para extenuar o meu corpo e a minha mente será que te conseguirei abandonar como tu me abandonaste a mim há muito tempo atrás?

17.05.2007

6 comentários:

Unknown disse...

É certo que o Amor,por vezes é sinónimo de dôr.
Mas abandono,encerra algo de definitivo,de cruel....isso,dificilmente poderá ser considerado Amor.
Talvez se torne mais fácil reconhecermos o que é realmente,quando sabemos o que não o é?

João Carlos Carranca disse...

Todas as praias são boas praias para nos encontrármos connosco.

algevo disse...

Alexandre,

O abandono faz parte das nossas vidas. Já todos fomos abandonados ou abandonámos alguma coisa nalguma altura das nossas vidas.

E sim, para mim, o Amor, também tem uma componente de dor, que até aprendermos a dosear de forma racional causa sofrimento inútil.

Beijo

I.

algevo disse...

Meu queridissimo Jota,

Tenho saudades da praia, outra vez.

Ou pergunto direcções ou compro um mapa, ou arranjo uma nova praia.

Como sempre, cheio de razão.

Beijos e beijos.

I.

Unknown disse...

Respeito naturalmente....mas,será que hexiste alguma coisa de racional em sofrer ou fazer sofrer,ainda que por amor?

algevo disse...

Alexandre,

Não se trata tanto de ser ou não racional, trata-se de ser apenas humano.

E quem de nós não o é?

Ao sermos diferentes uns dos outros, não faz só por si, que ainda que inadvertidamente, nos magoemos?

I.