11 agosto 2006


Hoje escrevo-te.
Escrevo-te para te dizer que não te guardo rancores.
Guardei-te nos mais lindos e inacessíveis e remotos locais das minhas lembranças, memórias e recordações, num baú escondido do meu coração.
Mas escrevo-te para te dizer que não existem rancores.
Todas as lágrimas secas e molhadas que me correram pelas faces e pelo corpo, secaram ou molharam a terra.
Enxutas pela mão ou apenas secas pelo vento.
Traçaram um caminho à muito percorrido por outras que as antecederam.
Não foste diferente de todos os que caminharam o meu corpo e a minha vida.
Porque hoje, enquanto te escrevo esta carta de quem não guarda rancores, apercebi-me finalmente que o amor tem sempre duas faces, tem sempre dois lados. Ou até mais.
E o amor nunca é puro. E por isso morre, lentamente. Como o meu.
Como assim também foi com o teu.
Não fui mais que uma, na altura a única.
Não fui mais que um estar. Não fui mais que um viver.
Na altura a melhor.
Mas a que não fica.
Como tantas outras.
Mas o sabor do teu hálito ainda não me deixou por completo. E nalgumas noites ainda acordo com o teu respirar no meu lóbulo. No meu pescoço. E só paro de te sentir quando o estremecimento passa para lá das coxas.
És como um tiro. Um pequeno gozo que nos demos em tempos que já lá vão.
Tu és a alma que não fica. És como a brisa que sopra aqui e já está lá adiante.
E por isso não me vou mais perguntar, interrogar, questionar o porquê do teu abandono. Do teu não querer.
Mais.
Não mais te vou procurar. Perseguir. Assombrar. Relembrar do meu querer.
Os meus rancores secaram à medida que a tinta vai secando nesta carta.
Não mereces a pena.
Vou-te recordar apenas no que mereces a pena ser recordado. Em mim. No meu amor. Na minha necessidade de amar.
Em tudo o resto te vou apagar. Diluir na água.
E um dia, serás apenas uma lembrança de uma coisa boa e agradável, como todas as outras que vamos deixando para trás ao longo da vida.
E até terei saudades.
Permitir-me-ei ter saudades. De ti.

07.08.2006

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